sábado, 11 de outubro de 2008

Visão dos católicos e dos evangélicos sobre a Igreja

Visão dos católicos e dos evangélicos sobre a Igreja

Queridos irmãos católicos:
Nossos irmãos evangélicos nos dizem muitas vezes: Só Cristo salva, a Igreja não salva.Isto é, os irmãos evangélicos aceitam somente a fé em Jesus Cristo e sua Palavra e não aceitam que a Igreja, como Corpo de Cristo, foi instituída por Ele mesmo e é por meio dela que Cristo quer salvar os homens.Este ensinamento dos evangélicos é muito atrativo e tentador, porque simplifica bastante a religião: basta ter fé em Jesus Cristo e em sua Palavra e alguém se salva; não necessita nada de Igreja, nem de sacramentos, nada de hierarquia, menos ainda de obediência ao Papa.
Nós, os católicos, devemos perguntar-nos muito seriamente se este conceito evangélico acerca da Igreja é correto ou não ou é apenas uma meia verdade.Nesta carta buscarei expor as duas visões de Igreja: a dos católicos e a dos evangélicos. Creio sinceramente que este é o ponto chave da triste situação entre os cristãos de hoje. Não é minha intenção ofender meus irmãos evangélicos. Não é o prazer de discutir o que me faz escrever esta carta, mas é ao amor pela verdade o que me move a escrever estas palavras e só a verdade nos tornará livres (Jo 8,32).Quando aqui falo dos evangélicos, eu me refiro aos membros das diferentes Igrejas que têm sua origem na Reforma do século XVI. Enquanto nós, os católicos, falamos das “igrejas protestantes” (por seu protesto contra a Igreja católica), os protestantes preferem falar da “igrejas evangélicas” ou “os evangélicos”, por sua volta radical ao Evangelho.
Em geral, todas as Igrejas evangélicas seguem o conceito de Igreja que lhes foi entregue pelos grandes reformadores: Lutero, Calvino, Zwinglio. Por isso é importante ver primeiro o que aconteceu no século XVI.Mas antes de ler esta carta, recomendo-lhes que leiam minha carta anterior: “Jesus quis uma única Igreja?”. Ali encontraremos uma profunda reflexão bíblica acerca da união misteriosa entre Jesus Cristo e sua Igreja. Aquela meditação nos faz ver que aceitar Cristo é também aceitar sua Igreja.

Um pouco de História
Ao terminar a Idade Média, a Igreja Católica encontrava-se numa triste situação religiosa e moral que alcançava até as mais hierarquias eclesiásticas. Buscar honras, diversões e dinheiro era a aspiração comum entre a maioria dos sacerdotes, bispos, cardeais e Papas. E na vida dos cristãos manifestaram-se muitas práticas e devoções religiosas muito duvidosas.Não se compreendia já a autoridade da Igreja como uma autoridade divina e a obediência à Igreja não se entendia já como um ato de Fé. O sentido profundo e misterioso da Igreja como “Corpo Místico de Cristo” obscureceu-se, isto é, a Igreja como “corpo Místico de cristo” não funcionou” não funcionou mais na vida dos cristãos. E a imagem exterior da Igreja, com seus grandes desvios humanos, confundiu-se com o mistério da Igreja.

O conceito de Igreja segundo os evangélicos
Lutero e os reformadores negam que Jesus quis uma Igreja. Para eles a Igreja não é uma instituição de salvação e de graça. Eles acreditam que é somente por meio do Evangelho e da Palavra, que o Espírito Santo provoca o ato de fé e realiza assim a justificação (salvação) do homem. E a Igreja tem uma função secundária: “ser servidora da Palavra”.Explicando o mistério da Igreja, Lutero fez a famosa distinção entre “Igreja espiritual” (Igreja com maiúscula), Igreja invisível e entre “igreja visível” (igreja com minúscula). Esta distinção, na prática, continua viva até hoje entre os evangélicos.
1.A Igreja espiritual (Igreja com Maiúscula). É uma entidade invisível, escondida, interior e sem estruturas visíveis, nem hierárquicas. Esta Igreja escondida existe ali onde a Palavra de Deus é pregada e escutada em toda sua pureza. É uma realidade misteriosa e invisível, é a comunidade de fé (igreja “do Credo”) que nasceu para a Palavra. E, segundo eles, todos os verdadeiros crentes que escutaram e aceitaram o Evangelho puro pertencem a esta Igreja. A Igreja invisível é totalmente “uma”, nunca pode ser dividida e só deus conhece seus membros. A Igreja espiritual é o Corpo de Cristo. Esta Igreja escondida pode existir sem necessidade de uma Igreja visível.
2.A igreja visível não é de instituição divina e não tem caráter absoluto com uma autoridade divina e obrigatória. Claro que é necessária uma certa organização e ordem, mas a igreja em sua forma externa é sempre relativa, pode cair em erros e ser infiel. A igreja visível não é de nenhuma maneira uma realidade sobrenatural e misteriosa. Lutero diz que nenhuma frase da Bíblia está a favor de qualquer igreja visível. A Palavra de Deus é o único sinal externo que faz confrontar o homem com a comunidade espiritual. E a função da igreja visível é somente ser servidora da Palavra”.Concluindo, podemos dizer que a Igreja na terra, como comunidade de graça e sobrenatural, é rejeitada pelos evangélicos. A justificação (salvação) chega ao homem pela Palavra e não pela Igreja.
3.Os sacramentos da Igreja se reduzem ao mínimo: ao batismo e à ceia do Senhor. Mas não é verdade que a Igreja por meio dos sacramentos produz um estado de graça divino no homem. Os sacramentos têm força unicamente pela palavra. São só expressões de fé e não dão a graça por eles mesmos senão pela fé. Os sacramentos não são de maneira nenhuma ações de cristo por meio da Igreja.
4.Quanto ao mistério de direção das comunidades, os evangélicos negam o estado sacerdotal, porque dizem que os cristãos todos são sacerdotes. Não faz falta intermediários, já que Deus salva o homem diretamente. Cada cristão é sacerdote de si mesmo e cristo é de todos. Por isto, os evangélicos rejeitam toda mediação da Igreja. E se existe um ministério na Igreja, este ministério é só “Suma função” como outros serviços dentro da Igreja. O único e verdadeiro ministério da Igreja se reduz à pregação e ao culto mas não o necessitam como um serviço à unidade e menos como um ministério sacerdotal de salvação.

O conceito católico de Igreja

A Igreja católica em sua reflexão acerca do ministério da Igreja nunca fez esta diferença artificial entre “Igreja espiritual” e “Igreja visível”. Não há nenhuma indicação clara na Bíblia para fazer esta separação.1.A Igreja Católica sempre seguiu a dinâmica da encarnação, isto é, o verbo (Cristo) se tornou visível, se fez carne e entrou na história dos homens. Esta encarnação de Cristo prossegue de modo renovado na Igreja que é o Corpo de Cristo cá na terra (Mt 16,13-20). A Igreja é a continuação de Cristo encarnado neste mundo. Por isso a Igreja de Cristo é ao mesmo tempo comunidade visível e comunidade espiritual; é ao mesmo tempo comunidade hierárquica por instituição divina e corpo místico de Cristo. A Igreja de Cristo é uma só realidade e tem inseparavelmente aspectos humanos e aspectos divinos e não são duas realidades distintas, como os evangélicos proclamam. Aí está o mistério da Igreja que só a Fé pode aceitar.2.A revelação divina não se limita à Palavra escrita senão que está na Palavra escrita ( a Bíblia) e a Tradição da Igreja, que ajuda a compreende-la e atualiza-la através dos tempos. A revelação divina compreende a Sagrada Escritura e a Sagrada Tradição. “Mantenham-se firmes guardando fielmente as tradições que lhes ensinaram por palavra ou por escrito (2Tes 2,15). Ademais a Igreja de Cristo, guiada pelo Espírito Santo, é “coluna de verdade” (1Tm 3,15), capaz de “guardar o depósito das sãs palavras recebidas dos Apóstolos ao conjunto da Igreja.

3.Na Igreja de Cristo existe claramente aspectos objetivos criados por Deus e que de nenhuma maneira são criação humana. Estas realidades criadas por Jesus Cristo, como o ministério da unidade, o ministério da verdade e a plenitude da graça nos sacramentos, são realidades divinas intocáveis e infalíveis e visíveis aqui na terra. São aspectos objetivos que encontram sua origem na instituição divina. A Igreja Católica não duvida que ela é a Igreja fundada sobre a rocha de Pedro e que ela, com seu Magistério vivo e seu ensinamento infalível é o prolongamento ou encarnação de Cristo sobre a terra. A Igreja Católica está consciente de que com seus sacramentos, que são realmente ações de Cristo, comunica a plenitude da graça. E não pode ser de outra maneira, porque ela existe por vontade de Deus. E esta Igreja visível na terra é ao mesmo tempo, o corpo Místico de Cristo.Claro que podemos distinguir na Igreja um aspecto divino e um aspecto humano. Mas quando o católico fala da Igreja de Cristo, sempre se refere a esta realidade divina e objetiva, que é intocável e infalível aqui na terra. A Igreja de Cristo não é de origem humana e tem definitivamente um caráter sobrenatural. E não podemos duvidar da autoridade divina que Cristo comunica pelo Espírito Santo a seus apóstolos e seus legítimos sucessores, o Papa e os bispos.4.A Igreja de Cristo é sempre e em todas as partes a mesma, também em épocas de decadência, em tempos de pobreza espiritual e falta de compreensão, em tempos de ignorância e estreiteza de visão. A Igreja é sempre o corpo de Cristo e Mãe de todos os crentes. Cristo sempre é a Cabeça da Igreja que é “uma”, “santa”, “católica” e “apostólica”; e o Espírito Santo é sempre o princípio de vida desta Igreja. Disse Jesus a seus apóstolos: “Eu estou com vocês todos os dias até que termine este mundo” (Mt 28,20), e as forças do inferno não poderão vence-la” (mt16,18). Podemos dizer que nenhum católico pode aceitar que a visão acerca da Igreja dos reformadores do século XVI seja uma decisão definitiva.

Consideração final

Nós, os católicos, não podemos negar Lutero era uma personalidade profundamente religiosa, que buscou com toda honestidade e com abnegação a mensagem evangélica. Sua crítica contra a Igreja tinha uma intenção autenticamente cristã; a Igreja deveria repudiar sempre tudo o que não é evangélico.O mérito de Lutero e a Reforma é que descobriram de novo o centro da mensagem evangélica; só pela graça e pela fé na ação salvadora de Cristo, somos aceitos por Deus e recebemos o Espírito Santo, que nos convida a realizar boas obras. Nenhum católico vai negar esta mensagem evangélica. Mas Lutero tomou este núcleo do Evangelho e esqueceu tudo mais. Isto é uma simplificação do Evangelho que equivale a uma amputação. Porque, mesmo sendo o núcleo o mais importante, não é tudo. Lutero se viu forçado a construir um novo conceito de Igreja, que Lutero criou, é o ponto de maior dificuldade entre católicos e evangélicos. Os evangélicos atualmente não têm culpa do fato desta desunião e não estão privados de sentido e de força no mistério da salvação. Mas um católico nunca poderá aceitar esta opinião: “Cristo salva, a Igreja não salva”. È apresentar um cristianismo mutilado, é uma meia verdade. Aceitar Cristo significa aceitar sua Igreja. A Igreja é, portanto, o “Criador total”, sua projeção e encarnação no tempo.O Concílio Vaticano na Lúmen Gentium (nº 14) tem uma frase que dá muita luz a respeito: “Ensina que a Igreja peregrina é necessária para a salvação... e não poderiam salvar-se os que, sabendo que a Igreja Católica foi instituída por Jesus Cristo, como necessária, desdenharam entrar ou não quiseram permanecer nela”. Irmãos queridos, quando os convidem a mudar de religião, leiam e meditem estes temas que, repito, escrevi sem intenção de ofender e só para esclarecer a verdade. Católicos, leiam e meditem isto e não mudem de religião!